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    Episódio 12: Inflação de custos no agro: como gerenciar os negócios.

    No nosso décimo segundo episódio do Minuto Agro, o podcast do Agronegócio, falaremos sobre como a alta da inflação tem impactado os custos de produção no agronegócio e os efeitos disso na vida do produtor rural. Participa deste episódio Maurício Une, que é economista chefe do Rabobank para América do Sul.

    Transcrição

    Aline Araújo: Olá, sejam bem-vindos a mais um episódio do Minuto Agro, é questionando que evoluímos, o podcast da Indigo. Eu sou a Aline Araújo, Head de Comunicação da Indigo e esse é um espaço para você ficar atualizado sobre o que acontece no agronegócio no Brasil e no mundo. No episódio de hoje, falaremos sobre como a alta da inflação tem impactado os custos de produção no agronegócio e os efeitos disso na vida do produtor rural.

    Para conversar sobre o assunto com a gente, hoje temos um convidado especialista nesse tema: Maurício Une, que é economista chefe do Rabobank para América do Sul. Seja muito bem-vindo ao nosso podcast Minuto Agro.

    Maurício Une: Aline, muito obrigado pelo convite. E o prazer é todo meu!

    Aline Araújo: Para começar a nossa conversa, eu queria que você contasse um pouquinho para quem está nos ouvindo sobre a sua trajetória e como o trabalho de vocês está relacionado com o tema do episódio de hoje.

    Maurício Une: Olha, Aline, eu sou aqui economista-chefe do Rabobank para a América do Sul, estou trabalhando no banco já faz 2 anos, nesse momento e, antes disso, também trabalhei como economista sênior em outras casas, logo depois de vir de um doutorado em Economia na Inglaterra. Agora, de qualquer forma, Aline, nosso foco aqui no banco é exatamente entender como é que a gente tem essa interrelação entre o que que acontece da porteira para dentro e o que acaba repercutindo na economia como um todo da porteira para fora. Entender, então, a inflação global e local nesse sentido tem tudo a ver então, principalmente, para os nossos clientes e seus ouvintes.

    Aline Araújo: Muito legal o trabalho de vocês. Durante todo o ano de 2020, o agronegócio foi uma das indústrias que não só não sofreu o impacto direto causado pela pandemia, mas que também continuou crescendo. Porém, a agropecuária foi a principal responsável pela queda do PIB no 3º Trimestre de 2021. Existe alguma sinalização para a queda da indústria do agro no fechamento deste ano?

    Maurício Une: Olha, Aline, de fato a gente teve questões pontuais que acabaram ajudando a explicar esse fenômeno, como, por exemplo, na questão da pecuária, um destaque bovino com uma diminuição de abate de bois, tendo muito a ver também com a questão dos embargos, que a gente tem visto, mas a gente também acabou percebendo outras culturas que, neste trimestre agora, acabaram também performando, trazendo esse resultado um pouquinho pior da agropecuária. Então, a gente viu aqui, por exemplo, café, algodão, milho, cana como sendo destaques aqui, no levantamento sistemático de produção do IBGE, de produção agropecuária. De qualquer forma, aqui no banco, a gente ainda acredita, por exemplo, que nesse ano de 2021, apesar de ser um terceiro trimestre pior, a gente ainda acredita que o agronegócio consiga, de uma determinada forma, performar bem nesse ano e continuar ainda provendo bastante alimentos, não só para a economia doméstica, mas também para a economia global.

    Aline Araújo: O índice de inflação dos custos de produção do agronegócio brasileiro teve alta e é um dos maiores dos últimos anos, sendo a safra 21/22 uma das mais caras deste século. Quais são os principais fatores que desencadearam isso?

    Maurício Une: Olha, Aline, a gente tem vários fatores que acabaram explicando isso de uma determinada forma. Eu vou falar mais do aspecto macroeconômico nesse momento. Então, por um lado a gente tem commodities, de uma forma geral, que mantêm o preço relativamente elevado e isso aqui, por um lado, ajuda na receita dos nossos agropecuaristas, mas, por outro lado, a gente também continuou vendo que, quando a gente para para falar de energia e combustíveis, de uma forma geral, ao redor do globo, a gente também tem visto uma pressão muito forte. Então, o preço do barril de petróleo ao longo de 2021 ficou bastante forte e isso tem um impacto direto também no custo dos nossos agropecuaristas e, de uma certa forma, também a energia elétrica aqui refletindo bastante essa questão climática. Isso, de uma determinada forma, ajuda a explicar não só a energia elétrica mais cara, mas também esses alimentos que acabaram ficando mais caros nesse finalzinho de inverno aqui no Brasil, por exemplo, e se mantendo de uma determinada forma também mais altos ao longo do 3º trimestre.

    Aline Araújo: Você falou a respeito do preço do combustível. Aqui no Brasil, ele é parte importante da pauta inflação e tem sido assunto recorrente no mercado. Qual é a tendência que você enxerga para os próximos meses?

    Maurício Une: Olha, Aline, quando a gente fala de combustíveis, é impressionante. A gente para para falar, por exemplo, de inflação em 12 meses, parando para pensar pelo IPCA 15, a gente teve aqui uma inflação desses combustíveis, tanto gasolina, etanol, óleo diesel e gás veicular ao consumidor na ordem de, praticamente, 50%. Combustíveis, de fato, têm um peso bastante alto no IPCA, mas, de uma forma geral, eles acabam tendo uma dissipação rápida. Então, ainda que estejamos vendo uma pressão muito forte, dessa inflação muito alta, elas dão uma sensação para a gente de que, ao longo dos próximos 6, 9 meses, essa inflação de hoje, por exemplo, num choque desse porte, poderia dar alguma coisa do tipo 0,5 ponto percentual daqui a 6, 9 meses à frente. Então, de uma determinada forma, isso ajuda a manter a inflação pressionada para cima ao longo de 2022, não só combustíveis, mas também energia elétrica. Nesse ano, a gente já teve aqui também o aumento, ao longo desses últimos 12 meses, acabados em novembro, com IPCA 15, ao redor de um pouco mais de 30%. Que se tivesse o repasse completo ao longo dos próximos 12 meses, a gente teria aí uma inflação, de uma determinada forma contratada, mas também pressionada de alguma forma ao redor desses 0,5%. Mas, o que eu acho ainda, de uma determinada forma, meio que preocupa é como a inflação ao domicílio, de alimentos, continua ainda muito alta. A gente está falando aqui de 11,5% praticamente, nesses últimos 12 meses e essa inflação, sim, tem uma inércia maior e acaba tendo um impacto bastante forte na inflação do ano que vem. E, por isso aqui a gente acha que a inflação no ano que vem fique mais próxima então de 4,9%, ficando acima, então, da banda superior para o Banco Central.

    Aline Araújo: Você falou aí a respeito da questão energética e da questão dos combustíveis. Pensando aí no último índice IPCA divulgado, foi um dos maiores desde o início do Plano Real. Além desses fatores, o que mais a gente pode atribuir essa crescente na inflação em 2021?

    Maurício Une: Olha, Aline, ao longo desses últimos 12 meses, além dessas questões que a gente já comentou, com relação aqui a questão climática, que acaba afetando a dinâmica da inflação de alimentos e de energia elétrica, o fato é que a gente continua com o preço do petróleo lá fora também bastante alto em comparação com o que a gente via antes da pandemia, temos que lembrar também que a gente continua com um ambiente de incerteza: em primeiro lugar porque as cadeias de produção propriamente ditas ainda não estão normalizadas. A gente vê o frete internacional ainda bastante alto, a gente continua percebendo, quando paramos para ver as divulgações do IBGE e também de outros institutos de estatísticas ao redor do globo, como que a falta de insumos para a produção industrial acaba afetando não só a própria produção industrial, mas também o varejo propriamente dito ou acaba ficando sem esses produtos para serem vendidos, a gente vê que a cadeia global também não está normalizada e isso faz com que os preços acabem ficando mais altos. E, por último lugar, a gente também tem uma incerteza com relação ao próprio patamar do câmbio do real em relação ao dólar americano. Continuamos sujeitos ainda aos choques da pandemia, acabamos de presenciar essa nova variante da COVID-19, que é a ômicron, então, de uma determinada forma, temos também alguns ativos de porto seguro, como dólar americano sendo ainda uma grande reserva de valor e, por outro lado, aqui, domesticamente, ao longo de 2021, a gente também percebeu uma certa dificuldade da economia brasileira, de uma forma geral, em equacionar melhor a questão fiscal. Então, essa incerteza fiscal, de uma determinada forma, se a gente está mudando o teto, não está mudando o teto, como é que isso impacta a sustentabilidade da dívida brasileira, acaba aumentando o prêmio de risco e o câmbio também fica impactado em função disso. Então, essas duas outras questões, a cadeia global de produção e a questão do câmbio, muito decorrente aqui da incerteza fiscal, são os outros dois fatores que acabam influenciando essa inflação ao longo de 2021 e 2022.

    Aline Araújo: Você trouxe um contexto muito amplo do nosso cenário macroeconômico atual. Como que isso pode impactar os ganhos dos produtores nesse momento?

    Maurício Une: Olha, por um lado, a gente está tendo uma situação, quando a gente para para pensar no longo prazo, ela continua anômala. O que eu quero dizer com isso? Geralmente, o Brasil é um país exportador de commodities e quando a gente vê, então, o preço das commodities lá fora de forma sustentada, percebemos que isso faz com que os exportadores brasileiros acabem acumulando dólares e esses dólares entram no país e o câmbio acabe, então, apreciando. Dessa vez, o que a gente tem visto, dada a incerteza global com a pandemia, a incerteza fiscal no Brasil, a gente tem visto uma coisa que não é comum que é tanto o preço de commodities alto, quanto o próprio câmbio brasileiro estando depreciado. Essa é uma situação que a gente não esperaria num longo prazo. Por um lado, o que a gente está percebendo nesse momento é que os ganhos estão sendo altos porque estamos tendo tanto o câmbio brasileiro depreciado, quanto o preço de commodities alto. Agora, se isso faz com que os ganhos no setor agroexportador seja mais alto, a gente também tem que lembrar que os custos dos nossos agroexportadores também ficam mais altos, porque eles acabam precisando também importar insumos, como no caso de fertilizantes, máquinas de uma forma geral, que acabam sendo bens de capital que são importados e esses custos acabam sendo mais altos também. Então, ao longo de 2020, 2021, a gente conseguiu relativamente equacionar bem nesses dois frontes, mas para 2022, a gente começa também a ficar mais restrito, ou seja, dá a sensação de que os ganhos futuros parecem não serem tão altos quanto a gente vinha vendo ao longo de 2020, 2021; mas os custos, sim, vão permanecer relativamente altos, então a tendência dos ganhos é deles diminuírem em 2022 em relação à 2021.

    Aline Araújo: E qual que é a melhor alternativa para o produtor rural brasileiro se proteger e continuar crescendo diante desse cenário?

    Maurício Une: Olha, Aline, nesse sentido, acho que é bastante importante aqui o produtor se precaver, sobretudo, pensando na sua estrutura de custos e pensando também que estamos ainda com o câmbio relativamente bastante depreciado, em relação ao seu valor que respeita mais a relação dos fundamentos da economia brasileira, ou seja, se tivéssemos um câmbio que estivesse respeitando os fundamentos da economia brasileira, ele estaria agora entre R$4.70 e R$5,00 e, no momento, estamos longe disso. Temos também uma questão fiscal que gera uma incerteza nesse momento e ainda um quadro eleitoral se aproximando e que, naturalmente, ao longo de todas as últimas eleições que a gente viu, percebemos uma tendência de volatilidade maior do câmbio. Então, acho que ao longo de 2022, se a gente puder, então, se o agroexportador, por exemplo, puder, então, se proteger, dessa volatilidade, desse câmbio ainda bastante depreciado, essas são as estratégias ganhadoras.

    Aline Araújo: A gente está chegando no final do nosso episódio e você tocou num ponto exatamente da minha última pergunta: 2022 é ano eleitoral. Qual é o impacto do fator eleição? O que ele pode gerar no processo de retomada da economia? Podemos esperar já em 22 que tenhamos queda da inflação e crescimento da indústria em geral?

    Maurício Une: Olha, Aline, a eleição de uma forma geral, como nas eleições anteriores, ela sempre introduz, então, esse elemento de volatilidade dos ativos brasileiros e nosso público precisa levar isso em consideração. Agora, quando a gente para para ver como é que esse desafio, que é controlar a inflação nos próximos semestres, a gente vê, então, o Banco Central autônomo, vigilante e que, nesse momento, tem sido um dos bancos centrais ao redor do globo que tem tentado conter ao máximo esse processo de inflação à frente. Acabamos de mencionar o quanto combustíveis, de uma forma geral, ou energia elétrica têm subido e se a gente para para ver no nível do produtor, já chegamos a ver o IPA, nesse ano subindo, por exemplo, 50% e esse IPA já cedeu bastante. Ao consumidor na ponta, estamos vendo a inflação chegando a 10% e quando a gente compara com outros países, os choques foram grandes, mas no consumidor final, muitos dos choques foram repassados; o que a gente acabou não vendo aqui, o que significa que a gente vê, de fato, um Banco Central bastante ativo, que tem olhado e tentado controlar essas expectativas de inflação e já subiu bastante a taxa de juros, por conseguinte. A gente estima no Banco que essas taxas de juros continuam ainda em processo de alta para ajudar a conter essas expectativas de inflação ao longo de 2022 e, nesse sentido, sim, imaginamos que a inflação saia do redor dos 10% de 2021 e venha para alguma coisa mais próxima desses 4,9% que a gente estava comentando anteriormente. É um processo de desinflação importante, ajuda a estabilizar a economia e isso faz com que o produto brasileiro, de uma forma geral, fique mais estável nos próximos semestres, nos próximos anos; mas esse juro mais alto também, por outro lado, faz com que a gente tenha um crescimento menor em 2022.

    Então, hoje a gente aqui no banco trabalha com um crescimento de 4,8% em 2021, que pode ficar mais próximo, então, de um crescimento de 0,6% em 2022. No setor agro, por outro lado, a gente acha que o crescimento ainda pode ser robusto, ao redor de 2% a 2,5%, mas com isso temos uma taxa SELIC que pode alcançar 11,75% no 1º trimestre de 2022, mas dado que a inflação comece ficando mais controlada no final desse ano de 2022, e 2023 a gente se encaminha em direção à meta, ao redor de 3,25%, isso vai fazer também com que a gente tenha o Banco Central podendo começar a cortar juros talvez já no final do ano que vem, 2022; podendo já alcançar aqui uns 10,75% de SELIC no final de 2022. Agora, com relação ao câmbio, a gente pode alcançar uns R$5,50 de câmbio de reais em relação ao dólar, no final de 2021. Esse câmbio, ele pode continuar ainda volátil e mais depreciado também por causa das eleições e da incerteza fiscal; mas, ao final do ano de 2022 ele termina em R$5,60 e continua aí o processo de acomodação, indo mais próximo aí de R$5,30 no final de 2023. Então, esse aqui é o cenário com que estamos trabalhando nesse momento, mas, enfim, vamos continuar atentos aqui ao que permanece a dinâmica de inflação, já que ela é que tem captado melhor como é que a dinâmica macroeconômica acaba se desenvolvendo ao longo do tempo aqui.

    Aline Araújo: Muito legal. Bom, Maurício, esse foi o episódio de hoje do nosso Minuto Agro. Eu queria agradecer muito a sua participação, seu tempo, a sua disponibilidade. Você deu uma aula aqui pra gente a respeito do que esperar da nossa economia para um espaço aí, do próximo ano. Queria deixar aqui o espaço aberto para suas mensagens finais, deixar para o produtor rural, que está nos ouvindo, uma mensagem aí a respeito da próxima safra.

    Maurício Une: Aline, gostaria de agradecer bastante aqui o espaço que vocês nos deram, um espaço que é superimportante pra gente aqui no banco, da gente se comunicar com o setor, como um todo. 2022 é um ano que também ainda vem com bastante desafio, a gente precisa estar atento a determinados, como é que a pandemia continua evoluindo, o que é que isso diz respeito à inflação global e local; mas, de uma forma geral, eu acho que, apesar de 2021, a gente perceber que essa diminuição da dinâmica do desenvolvimento do setor agro, ao longo de 2022, a nossa expectativa continua sendo, então, de uma recuperação desse movimento. Mas, que requer também mais cuidado aqui, monitorando também, principalmente, essa estrutura de custos, ao longo de 2022.

    Aline Araújo: Muito obrigada, Maurício. Eu espero aí que você tenha um excelente final de ano, pra você, pra sua família. Agradecer aos nossos ouvintes por nos acompanharem até aqui. A nossa conversa foi ótima.

    Maurício Une: Obrigada, Aline. Agradeço de novo aqui o espaço e desejo o mesmo pra você, para a sua família e para todos os que estão nos ouvindo nesse momento.

    Aline Araújo: Esse foi o nosso episódio de hoje do Minuto Agro. Espero que vocês tenham gostado. Obrigada a você, ouvinte, por nos acompanhar até aqui. E obrigada a você, Maurício, pela participação. Nossa conversa foi ótima!

    Este episódio teve produção e colaboração técnica de roteiro e de pauta do supertime de Comunicação da Indigo. Nos sigam em todas as plataformas digitais para não perder nenhum episódio. Terminamos aqui mais um podcast Minuto Agro. Esperamos você no próximo!