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    Episódio 14: A crise no mercado de fertilizantes e seus impactos no agronegócio

    O Minuto Agro é o podcast Indigo do Agronegócio.

    Neste episódio, falaremos sobre como a variações nas taxas de juros impactam o setor do agronegócio, principalmente no mercado de fertilizantes atualmente, suas consequências e algumas alternativas para o produtor rural. Nosso convidado é Bruno Fonseca, Analista Sênior de Pesquisa e Análise Setorial para o mercado de insumos do Rabobank Brasil.

    Transcrição

    Aline Araújo: Olá, sejam bem-vindos a mais um episódio do Minuto Agro, é questionando que evoluímos. O podcast da Indigo. Eu sou a Aline Araújo, Head de Comunicação da Índigo. E esse é o espaço pra você ficar atualizado sobre o que acontece no agronegócio no Brasil e no mundo. No episódio de hoje, vamos falar sobre a crise no mercado de fertilizantes, seu possível desabastecimento e os impactos que isso vai causar no agronegócio e para o produtor rural no Brasil e no mundo todo.

    Para conversar sobre o assunto com a gente, hoje temos a participação de Bruno Fonseca, analista sênior de pesquisa e análise setorial para o mercado de insumos do Rabobank Brasil. Sejam muito bem-vindos ao nosso episódio do podcast Minuto Agro. Boa tarde, Bruno. Tudo bem?

    Bruno Fonseca: Oi, Aline. Obrigado pelo convite. É um prazer estar aqui com você falando um pouco sobre agronegócio e ajudando a esclarecer alguns
    pontos para os nossos ouvintes.

    Aline Araújo: Para começar o nosso bate-papo, eu queria que você contasse um pouquinho, para quem está nos ouvindo, a respeito da sua trajetória profissional.

    Bruno Fonseca: Eu sou engenheiro agrônomo, formado pela ESALQ/USP. Trabalho há mais de 12 anos com análise de mercado, a maior parte desse tempo em trade. Já trabalhei com açúcar, etanol, soja, milho, trigo, algodão; praticamente todas as grandes culturas. E atualmente eu sou analista sênior de pesquisa em análise setorial para o mercado de insumos aqui no Rabobank Brasil.

    Aline Araújo: Bacana! A gente gostaria de ouvir um pouquinho a respeito do panorama sobre o mercado de fertilizantes no Brasil, destacando a importância para o agronegócio. Quais são as dores e fortalezas desse nicho na agricultura?

    Bruno Fonseca: Claro, vamos lá! Um bom estabelecimento de qualquer cultura, ele passa por um plantio bem feito, com boas sementes e uso de fertilizantes. A gente pode colocar isso como uma fundação, o alicerce para uma boa produtividade. A gente brinca que adubando dá. Então, é bem por aí. Porque a gente sabe que os nossos solos, eles têm uma demanda para que a gente reponha o nutriente que foi retirado nos anos anteriores, porque são solos que têm essa demanda. Então, a gente precisa realmente fazer um bom estabelecimento da cultura, com plantio e tudo mais, além do uso de fertilizantes. Agora, já trazendo um pouquinho para o contexto mais atual, o Brasil importa a cerca de 90% de todo fertilizante que é consumido aqui no país, ou seja, nós somos o principal mercado consumidor do mundo. Isso acaba fazendo com que sejamos bastante expostos a qualquer problema nos países de origem desse adubo, como o que a gente está vivendo agora com a Rússia. Assim também como qualquer variação cambial, que pode trazer grandes riscos para o mercado brasileiro de fertilizantes.

    Aline Araújo: No último ano, o COPOM - Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil, elevou diversas vezes a taxa SELIC. A gente saiu de um patamar de uma taxa próxima de 3%, chegando agora acima de 11%. Que efeitos essa alta teve no mercado de fertilizantes? Como que essa crise atingiu o estoque? Qual o reflexo disso no Brasil?

    Bruno Fonseca: Aqui a gente pode dividir em duas partes, pensando de forma mais prática. A parcela de fertilizante que estava comprado não teve tanto impacto, porque foi antes dessas altas mais acentuadas da SELIC. Agora, pensando lá na parcela que vai ser comprada daqui pra frente, a parte obviamente de todo aumento dos custos que a gente está tendo por conta da guerra na Ucrânia, essa parcela sim, ela vai ter impacto agora dos juros, porque o dinheiro, entre aspas, ele vai ficar mais caro para o produtor. Quando ele for tomar esse recurso junto a uma instituição financeira, com o juro maior, esse dinheiro vai acabar ficando mais caro. Então, a gente pode colocar isso como um dos principais fatores que podem impactar o mercado de fertilizantes também para esse próximo ano.

    Aline Araújo: Explicando um pouco mais o contexto, para quem está nos ouvindo, qual é a relação entre o desabastecimento de fertilizantes com o cenário da crise que envolve Rússia e Ucrânia no momento?

    Bruno Fonseca: A Rússia, ela é um importante player no mercado de fertilizantes, na ponta vendedora. Se a gente colocar o mercado de fertilizantes nitrogenados, ela tem 10% dele, ela tem 7% no mercado de fósforo e quase 20% de share, no mercado de potássio. Então, qualquer mercado, quando você tira uma grande parcela da oferta, para o mercado voltar para o equilíbrio, os preços têm que subir muito para matar um pouco dessa demanda. Daí, voltando à sua pergunta, o que a gente pode concluir é que, enquanto esses conflitos estiverem durando e, principalmente, se as sanções continuarem, nós vamos continuar observando esses preços mais altos, dado a uma oferta menor. Pensando em 2022, isso com certeza, a gente vai ter esse efeito de preços mais altos e possíveis faltas desses adubos aqui no mercado brasileiro e também em outros lugares do mundo, não só no Brasil, é importante ressaltar isso. Já para 2023, pensando no ano seguinte, ano que vem, a gente poderia imaginar que não. Mas, isso, claro, que passa ali pela solução dos conflitos e também, acima de tudo, pelas sanções que estão sendo impostas à Rússia. Porque não é só o término do conflito. A gente também tem que olhar por quanto tempo as sanções vão durar, após o término desse conflito, pra gente conseguir ter uma avaliação mais clara de como vai ficar a situação dos fertilizantes, tanto no preço, quanto na disponibilidade.

    Aline Araújo: Você trouxe um número super relevante no começo da nossa conversa. O Brasil importa cerca de 90% das suas necessidades de fertilizante. Assim, qualquer movimento das taxas de dólar tem efeito nos preços diretamente para o produtor rural, além do que a gente já comentou a respeito do conflito atual de Rússia e Ucrânia. Na sua perspectiva, existe uma possibilidade concreta de novas sanções que inviabilizem a exportação do produto para o Brasil?

    Bruno Fonseca: Sim, a gente tem observado algumas sanções ficando um pouquinho mais sérias agora. A gente viu agora que o Biden está visitando a Europa, a imposição de mais algumas sanções. Então, a gente pode imaginar que sim, algumas novas sanções podem acabar acontecendo e acabar estrangulando um pouquinho mais a economia russa e, até impactando o mercado de fertilizantes, como já tem impactado nos pagamentos, mas também no setor, mais especificamente, que a gente pode imaginar que isso aconteça.

    Aline Araújo: E qual seria o impacto disso para o produtor?

    Bruno Fonseca: De impacto para o produtor, a gente pode imaginar que hoje, continuando com esses conflitos da forma que a gente tem observado e as sanções para a Rússia, não vai continuar tendo exportação de fertilizantes da Rússia para outros países, inclusive o Brasil. Então, a extensão e o aumento dessas sanções, atingindo o setor de fertilizante, pode aumentar ainda mais o possível déficit de fertilizante que vai ter aqui no Brasil. O caso mais sério é o do cloreto de potássio, dado o tamanho da Rússia e da Bielorrússia também, mas a gente não pode excluir o fósforo e também o nitrogênio. Então, é mais ou menos por aí que a gente vê.

    Aline Araújo: E como uma das alternativas, em como lidar com essa crise, o Brasil possui o Plano Brasileiro de Fertilizantes, que iniciou um esboço e tem metas de longo prazo, prevendo uma redução de até 45% nas importações de fertilizantes, até 2050. A curto prazo, os técnicos da Embrapa serão enviados a polos produtivos para mapear o manejo de insumo e propor maneiras de economizar o seu uso na lavoura. Você acha que esse tipo de medida pode ser eficaz para minimizar a dependência de insumo de outros países, especialmente neste cenário de crise?

    Bruno Fonseca: Essa é uma medida extremamente interessante, se a gente for observar e, inclusive, ela poderia ser mantida para os próximos anos, fora até do período de crise. Isso ajuda o produtor a ter um uso mais eficiente do insumo e também ajudaria numa redução de custos e aumento de produtividade. Mas, pensando agora no cenário atual, os produtores vão sim precisar de toda ajuda possível para trabalhar a safra com um pouco menos de adubo, ou até quase sem adubo, tentando não impactar tanto assim a produtividade. Ou seja, é uma medida super interessante, porque até quando converso com os nossos clientes aqui no banco, a gente comenta que esse é um ano de manejo então, o produtor vai ter que estar muito mais atento ao manejo da lavoura. Então, essa ajuda que vem para os produtores, ela vai ser essencial para que eles consigam atingir boas produtividades agora nesse ano de desafio super alto.

    Aline Araújo: Uma outra medida que está sendo discutida, é o aumento da importação dos fertilizantes de países como o Canadá e Irã, já que não existe estoque suficiente para a produção no país. Mas, ainda há o temor de que essa medida não seja suficiente para compensar a importação desses insumos e conter os impactos na agricultura brasileira. Qual é a sua opinião a respeito dessa frente?

    Bruno Fonseca: Essa é uma frente super importante, que a gente até destaca, de forma global, a atuação do Ministério da Agricultura, também tem sido super importante nesse sentido. E a gente coloca também até a visita que a ministra Tereza Cristina fez ao Canadá. Sim, a gente pode imaginar que, esse aumento de importação de outros países, vai ajudar sim, com certeza. A gente está numa situação onde um player muito grande, que é a Rússia, no caso de nitrogênio e fósforo e dois players muito grandes, que são a Rússia e a Bielorússia, no caso de potássio, que provavelmente não estarão exportando fertilizantes, então, é um buraco que a gente imagina que vai ser bastante grande. Então, qualquer ajuda que a gente consiga ter de outros países, vendendo fertilizante para o Brasil, é uma medida super importante, é uma coisa que a gente tem que se esforçar bastante para que aconteça isso. Porque senão, a gente pode chegar no final do ano, ali no plantio da safra de verão, especialmente a safrinha, com um déficit bastante grande de fertilizantes aqui no Brasil.

    Aline Araújo: Pegando um pouco desse gancho a respeito do déficit, pensando em um cenário que não é o que ninguém espera, mas pensando em um cenário onde a crise se agrave. O que a gente tem de perspectiva para o ano de 22/23? O que que a gente pode fazer, de outras iniciativas para melhorar o quadro? A gente tem aqui hoje no Brasil, a própria ministra Tereza Cristina comentou, em uma das suas entrevistas recentes, que o fertilizante para essa safra já está aqui, no solo. A preocupação é para as próximas. Quando acabar, o que pode ser feito?

    Bruno Fonseca: O que vai acabar acontecendo, a gente imagina, Aline, a gente tem três meses de estoque, como a ministra comentou, mas a gente vai continuar recebendo. Como você disse, para essa safra já está tranquilo, a gente agora vai passar por um período de entressafra, com menor utilização do fertilizante, mas, ainda assim, ao longo desses meses, a gente vai continuar construindo estoque com o fertilizante que vem de outros países. Mas, quando a gente chegar lá em setembro, outubro, quando tem o início do plantio da safra de verão da soja, do milho, adubação do café e tudo mais, é nesse período que a gente vai começar a perceber que o estoque está abaixo do que seria necessário para a gente passar por um período de adubação normal da safra de verão aqui no Brasil.
    Então, o que a gente imagina que vai acontecer é a falta efetiva do produto e, isso a gente pensando que o conflito e as sanções continuem e que o Brasil e qualquer outro lugar no mundo não consigam continuar comprando o fertilizante vindo da Rússia. Então, é aí que a gente vai imaginar que vai aparecer um problema. O que o produtor pode continuar fazendo, até como uma estratégia: ele pode acabar fazendo a compra desse insumo, garantindo o recebimento, porque não adianta nada só ele comprar, ele tem que garantir o recebimento, não da parcela toda que ele precisa, mas tentar alguma coisa e fazer a aquisição agora. Apesar de que a gente está passando por perda de preço bem alto e o preço continua subindo, mas a melhor estratégia para ele deve ser fazer essa aquisição do fertilizante agora para não entrar muito lá no final da fila e correr o risco de ficar sem o fertilizante. Tudo concentrado? Não, tudo concentrado não. A gente imagina que o melhor seja ele ir diluindo um pouquinho, mas não perdendo um ritmo de compra e, claro, tentando fazer isso casado com a venda do grão também da produção.

    Aline Araújo: A gente está chegando no final do nosso bate-papo e eu gostaria de fazer uma última pergunta pra você. A gente comentou, no começo da nossa conversa, a gente trouxe um panorama a respeito da taxa de juros. Qual é a influência da taxa de juros no valor dos insumos, como fertilizantes?

    Bruno Fonseca: Esse movimento da SELIC, ele vai fazer com que a taxa de juros que o produtor vai ter, quando for tomar esse recurso junto a uma instituição financeira, fique mais alta, ou seja, vai aumentar o custo de dinheiro e, consequentemente, os custos de produção na linha dos custos financeiros, vai aumentar um pouquinho mais. Então, é um impacto no balanço do produtor, na linha do custo financeiro também. Outros pontos dessa subida é que o real vai apreciar, deixando o produto que é importado um pouco mais barato, quando negociado em real, vai acabar ficando um pouco mais barato. Então, daí a gente também pode imaginar que, com essa subida na taxa, o real fique um pouco mais estável. De forma geral, é mais ou menos o que a gente podia colocar.

    Aline Araújo: Bruno, eu queria agradecer a sua presença aqui no nosso podcast. Nossa conversa foi ótima. Obrigada realmente pelo seu tempo, pela sua disponibilidade, por todo esse conhecimento que você compartilhou com a gente. Queria deixar aqui aberto pra você, para alguma última mensagem que você queira trazer pra gente.

    Bruno Fonseca: Aline, eu só tenho a agradecer também o espaço que você disponibilizou pra gente aqui dividir um pouquinho, bater um papo sobre esse mercado. Eu acho que é um período de muita incerteza que a gente está vivendo agora no mercado de fertilizantes, então toda informação que o produtor tiver na mão é sempre super válida para que ele faça as melhores escolhas e defina a melhor estratégia para garantir uma boa safra pra ele. Muito obrigado.

    Aline Araújo: Obrigada. Esse foi o episódio de hoje do Minuto Agro. Eu espero que vocês tenham gostado. Obrigada a você, ouvinte, por nos acompanhar até aqui.

    Esse episódio teve produção e colaboração técnica de roteiro e de pauta do supertime de Comunicação da Indigo.

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    Terminamos aqui mais um podcast Minuto Agro.

    Esperamos você no próximo!